O dia acaba de nascer, o homem sai da cama e vai para a janela. Demora-se a olhar pela mesma, antes de iniciar o ritual de preparação para a rotina diária. Na cama a mulher interroga-se sobre o que lá fora, lhe despertará tanta atenção. Dentro do homem uma história nasce e personagens ganham vida. Mais tarde ela própria acercar-se-á da janela e verá por si: o rio que corre com a azáfama de barcos habitual, o telhal cheio de gente naquela altura do ano, uma algazarra de rapazes-homens e homens-homens todos ocupados em fazer do lodo que o rio traz, tijolo e telha. Trabalho duro e necessário. O homem chamava-se Soeiro Pereira Gomes e o livro que escreverá inspirado nessa observação diária chamar-se-á Esteiros e nele vivem para sempre esses “filhos dos homens que nunca foram meninos”, para todos nós “vizinhos” aqui de Alhandra. Esta é uma história nossa, esta é a nossa História. O jardim do Coreto é hoje o Jardim Soeiro Pereira Gomes ...
Vejo-a sempre quando venho na estrada, entra pelos olhos dentro, chama-me e desperta imenso a minha curiosidade. Num domingo gelado e chuvoso, decido atravessar Alhandra e ir até lá. Espero ver a entrada, fotografar o exterior, mas levo secretamente a esperança de que esteja aberta, embora me tenham assegurado que está quase sempre fechada. Chego e acho-a linda na sua simplicidade, branca com cercaduras azuis e uma cruz rendilhada a encimá-la. Toco na porta e está aberta, empurro-a devagarinho e piso um chão de mosaicos vermelhos e pretos. Entro. Lá dentro uma senhora reza a Nossa Senhora da Conceição, uma imagem pequenina e doce, num altar antigo espantosamente belo de talha dourada. Há uma rosa vermelha entre as flores frescas da jarra, e a tolha bordada é de um branco irrepreensível Lá em cima dois anjos velam também por quem entra. A senhora admira-se, diz-me que muito pouca gente a procura. E, no entanto, é um lugar mar...
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