Detalhes : Constantino Padinha, pescador do rio
Domingo à tarde, um domingo maravilhoso, cheio de sol e de gente que
caminha no Passeio Ribeirinho de Alhandra.
Meia dúzia de passos e surge o meu destino, um bairro de casinhas cor
de rosa todas iguais. Do lado direito, barcos, inúmeros barcos em terra (alguns
infelizmente completamente degradados) e uma pequena marina, com uma bateira e
vários barcos a motor. Florescem juncos nas margens e descubro um canteiro de
alecrim.
Está maré-vazia e as gaivotas patinham no lodo.
Do lado esquerdo há redes e narças que secam ao sol.
É aqui que vou procurar Constantino Padinha, pescador do rio.
Vou encontra-lo ao sol, na companhia da esposa Emília Mendes e de dois
dos seus filhos.
“É dia de descanso, acha que com esta idade não mereço já descansar?”
Afável, conta-me que sempre foi pescador no rio, que a sua vida é o
rio, que dantes o rio trazia muito peixe, mas que agora vai apanhando uns
robalinhos e de vez em quando uns linguados ou uma lampreia. Diz-me que os seus
pais eram varinos e que nasceu em Alhandra, na Rua Tomás de Almeida em 28 de
Novembro de 1937. Juntos, ele e Emília Mendes criaram cinco filhos no amor ao
Tejo e à arte da pesca no rio (Clara, Constantino, Céu, Iria e
José Carlos).
“Somos cada vez menos, a malta nova foge para outras coisas, um destes
dias a arte acaba”
Viveram muitos anos numa palafita, e agora numa das casas do bairro
que foi construído para as substituir. Os filhos sorriem enquanto ele fala
calmamente, palavras claras e certeiras.
Emília, mulher rija, fala apaixonadamente dos dias da “fome”, das
famílias inteiras que viviam em bateiras que eram assim casa e meio de
sustento. De como as crianças nasciam e cresciam.
Na coragem de parir um filho no fundo de um pequeno barco sobre as
águas do Tejo, com a ajuda de outra mulher, enquanto o marido e os outros
filhos esperavam ao longe.
Saio prometendo a mim mesma voltar, leve, espantada, feliz, e a ver de
outra forma os barcos que fotografo todos os dias, de manhã cedo no rio.
Bem-Haja!
•
“uma
comunidade piscatória sujeita a dificuldades e que corre o risco de
desaparecer”
Leonor
Teles cineasta in Expresso
•
"Os Varinos são provenientes de
Aveiro e da Murtosa, e chegaram a Alhandra no século XVIII, tendo-se fixado na
zona do sapal.
Os primeiros Avieiros chegaram em 1932, vindos de Vieira
de Leiria e as primeiras famílias (os Lobos e os Guerras) foram viver para a
Travessa do Oleiro. A segunda vaga chegou a Alhandra em 1958, tendo ficado
inicialmente a viver nas suas próprias bateiras, e posteriormente contruíram palafitas
na zona da Sociedade Euterpe Alhandrense e da Secção de Vela do Alhandra
Sporting Club."
in Memórias de um
Marítimo de João Bernardino Padinha, páginas 7 a 11
Memórias de um
Marítimo de João Bernardino Padinha, páginas 7 a 11
👏👏👏 Lindo !!!!
ResponderEliminarmuito obrigada💛
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